domingo, 27 de janeiro de 2008

gone gorgona 2



[Imagino-a funk. Imagino-a regorgitando tangos ou rumbando tangas en encanitadas ruelas vanguardistas.

Runf, dunf, panf.

A perdida despe-se para se despedir e descer escadas direitinho aos infernos, solteirona ou casada, despida e despedida pelos machitos e marialvas adjacentes eles mesmos idólatras do modernismo punheteiro com alvissaras fetichistas. Praga infame de salamaleques! Adulterada pelos ossinhos do ofício. Esfaqueada ou decepada? Decepcionada: i. é, encantada de fresco, frasco & frosques. Pirro passa apático ao lado da campa de Duchamp. Este pisca o olho a um Plutão piegas.

Nem últimas, nem antepenúltimas imagens (todas as imagens são a ganancia gazosa do intermezzo), mas um ostinato veemente funky para um requiem à memória de jardins selvagens com Fragonards a coçarem os pentelhos neo-abjeccionistas atrás de uns arbustos.

De Jocasta molesta-me o pensar como se destinou a ser mãe de netos. Mas caíu-lhe uma oraculite aguda em cima, tal como a outros que tambem sofrem de apolinisses agudas. Os deuses entram nas veias e por vezes abrem os apetites. Depois oferecemos-lhe sangue romanescamente e sem pactos à mistura. Os deuses participam na mais vampiresca e vanguardista teatralização das forças do mundo – são a nossa insensata vontade de continuar a viver com um pouco de gazolina madrasta à mistura.

Apoplexia pornográfica de orquideias mobiladas com carinho post-colonial.

Pateada à Patuleia (a ingerente gramma do gemido (vagas referências ao papá Derrida)

A paz apregoada pelo aurato percorria as pérgolas e chegava à galante gola de uma matrona depilada.



Vamos converter as mais insignes partituras ao credo cínico – musicalidade, mas sem olhares espasmódicos de pitagórico a entronizar interiormente soberanos celestes.

Ditadura do sem sentido ou do senso comum? Também não! Não sejamos rebuscados acólitos de palhaço Breton nem badamecos de amolecida prudência.


As cubistas pinacotecas deliciavam nos primordios banhos das cezannianas (narigudonas) raparigas, com a sua inclinação gótica e depilada, o seu ar teso de dianas a estarem-se nas tintas para que alguém se surpreenda com nacos de nudez. Davamos humedecidamente àlvissaras à abolição do assassinato – a legitimidade do crime aleatório é a lei da antes desejada condição revolucionária.


A reconstituição da máscara é uma lipoaspiração do espirito: aspirar ao mistério ministerial das formosuras fememeninas. O espanto da lingua que recobra o do som sentido através de otofofonéticos mantras (diria o camarada Haussman). A solar eurritmia babélica. O plexo vulnerável do venerável sexo. O ampliado complexo do comentátio interminável reduzido a uma vexação de compositor repetitivo.


Minuete-minete. O luxo androgeno. O genuino génio de hidrogénio (sintese forçada das mais retorcidas formas de pôr parenteses e parentes próximos ou afastados em qualquer esboço de consideração: e consequente falhanço com a companhia alógena de alguma indeterminação).

O predominio antropológico da predação troglodita tem os seus prestígios nómadas, mas a morte devolve-nos a uma caverna, a uma imanência forçada num escuro nada.

O riso rápido do samurai antes do sepoku!


Imagino-a no mínimo drunk – a caír a pique num hino beduino de um babuíno. O vinho bzzz. A mosca paf e ursinho puf. O absinto hhhhh.O mundo subterrâneo é em tudo identico a uma saída nocturna onde seduzirás o amor que te infernizará a vida.


- Querida, acompanha-me jogando à apanhada nas fúnebres lugubres lúdicas coroações dos reis dos infernos. Vigia a marabunda dos mordibundos que rosnam. Diz do epicentro da tua linguagem quem te deu o visto para o Aqueronte, o Letes, o Hádes?


Oh! Bálsamicas semanas. O visto estraviadito. Esculápio, deus das merdissuicidasa, onde estão as varinas daquela terapeutica vida?


O mastabismo é onde o morto se masturba no reino das sombras, de formas à beira de uma dissolução total, exibindo-se imortalmente para outros masturbadores – e no fundo a teoria museológica é essa vontade de perpétuar erecções eternas a pretexto de meditação e de conservação, em formol, da memória.


Imagino o baque da bunda que bufa o big-bang. Omnibus. Onanicus. Omnipresentificante.

Marginalia - obstetricismo e estética neo-canibal (cura à base de manifestos). Wwoaaf. Wouum.

Anona anã. Noé na Anadia. Nana (a do zola!). Nantes (a do édito). Nua... Nirvana? Nâ!


Perdido no ocaso. Do entulho da Mnésis (entre a Ménia e a Métis) e da velhacaria pressionante das citações o que é que se pode retirar? É o fluxo das imagens a êssencia da vida ou apenas uma instância balnear para fundar uma arqueologia logológicamente bárbara?


Caminha-se num lodaçal fastamagórico, numa floresta fecal? Ou há uma alternativa além de «passar», de sêr o passageiro estéril e insatisfeito de uma vida etiquetada de breve com epitáfio ou presépio a fazer render o culto? No fundo,«o que é o essa cena de realizar e onde é que está o sumo da porra da puta da vida?» - papagueamos como quem segue a lógica de um prelúdio musical.


O reverso do firmamento, o reverso do caos (que mui diligentemente o aprimora e aperfeiçoa) - a concretização sem patilhas! O espirito nominalista do concreto: não aquele que aprisiona, digere e caga submentedo-se ao obscuro poder da soberana-sacana obscuridade! Mas o que adere capta e decide com faca de pirata na boca. Traça na comunhão permanente a sua própria ascensão à falsificada Unidade que a si própria se refuta, ou, em melhores horas ironiza, a uma espécie experimental de Todo, sem bananeiras fascistas, e sem os abstractos perliminares hegelianos ou selvajaria ou impiedoso domínio – um Todo como quem se despe de (re)fresco]

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Gone Gorgona 1



[She was gone! Ela fora-se, findara-se e por aí adiante! Nós nem sequer tinhamos reparado na sua morte, estavamos demasiado entretidos com as subespécies de glórias privadas, como paquidermes acomodados às lamurias da lama. Tinhamos constatado isso ao lêr o jornal, e as recordações dela sublinhavam as nossas mortes vindouras, mas também as memórias que serão um dia apagadas, sem hipótese de reprodução. Ela era tudo menos uma deusa ou mesmo uma heroina. Eu recordava-a no seu azedume revolucionário, no seu justo direito de estar contra que me impressionava porque sabia ler nas entrelinhas dos injustos governantes as suas justas razões e um desejo sincero de levar avante um bom governo. Eu distânciava-me dos prós e dos contras na minha preplexidade cívica, um pouco mais mole do que estes activos actores, mas menos sábia, mais redundante que as conturbadas justiças-injustiças que eles levavam à prática. Mas o que é certo é que a recordava como se um verso shakespeareano surgisse do passado e entrasse na minha vida para me engasgar. E enganar. Shakespeare sabe a palitos e é bom para citar com tapas.


A sua morte ao mesmo tempo tumultuava-me e arejava-me. Tornava os instantes com vista para as coisas. Isto é, uma certa atmosfera poética instalara-se mesmo nas coisas mais pardas. Os ciprestes viam-se claramente da janela mesmo com nevoeiro. E ela parecia-me agora única, inesquecível, para lá de todo o choro. Via-a como uma isolda veneziana, numa barca, entre reflexos salpicados.


Dir-se-ia uma tumultuosa ária para uma pavana defunta de infanta. Quem morre são as músicas, mesmo as gravadas e digitalizadas, e já não há quem componha pavanas a sério, como as de Luys Milan para o rei D. João III, porque eram essas pavanas e não as de Ravel que me acodem em souvenirs guizados. De qualquer maneira era música fácil com cadências estereotipadas. E também me entrava na vida essa maravilhosa viuvez que um compositor pôs em música com pancadas fora do piano. Pancadas simpáticas a bater a sério no piano a querer magoá-lo pouco, com a voz a sussurrar-lhe algo, porque o piano é um luto perpétuo, e os pianistas sacodem esse som mortal, procuram-no batalhando com esses dentes planos, esse sorriso de calavera cínica de bodegon hispânico - a natureza está morta, mas não se cala.


E sobra-nos por enquanto o tempo. Encadernamos a fatalidade na fraternidade. O gosto do freguês azeda. Mas a frota dos tempos. cruza-se nas núpcias de Atum con Nun. Há um tempo piramidal de enigmas mortos e enxotados por plumas de avestruz velho – como um parentesis encenado, congelado, sem mortos para o contemplarem.


Ària do tudo ou nada, que fizeste?

Herda a merda, porque toda a herança é merdança, e mudando emudecemos para húmos. A casa dórica faz-se feérica, antigorgonica (gona gona) no plutónico choro que se demora e dá nas moradas namoradas da morte. É uma chatice que se obscura e uma obscuridade que se embrasa. A palaciana placenta de quem faz de tido o mundo sua casa. Tempo que se dissolve em contradictar os factos que são velhacos através das comarcas cegas dos mitos – as fábulas levantam-se de zonas cegas, e tornam o canalha sublime.

Levanta-se com leves argúcias, como uma venús verbal, e lépida arde em madre galanteante, em galateiamante gelatinando o imperfeito demiurgo que obstinadamente lhe deu corpo. A perfeita criatura desfaz-se das velhas mãos que moldantemente a ânsearam. Do escultórico e fabricante de fábulas a favas. Porco mas leão. Entre verde e vermelho : rosapálido.


A criação move a sua condição rastejante na direcção da pluralidade e não na da dissolução. Uma pluralidade conspurcada e organizada – colíbrida.

Esse é o fluvial mito que se co-agita debaixo das terras: àguas madrastas vindas do pseudo-primordial pranto (como um paramento nagual!) vertendo-se sobre uma vida que sobra aos rios rápidos das ângustias.


Aguenta-se como uma moradia arfante. A casa ratoeira de Orestes e a casa escancarada de Creonte. De Knossos o bifronte bisonte dialoga com a ébria híbrida tebana: esfinge versus Minotauro, coloquialmente, sem chás, cafés ou cafunés. E como colidem e coligam no insulto ambulatório os participantes no familiar holocausto oracular! Os bramanes agitam védicamente os versos cornudos das orgulhosas vacas que pastam cerimonialmente com o divino leite a acenar para sacrificio prometido. As suas tetas têm um poder que é o garante dos governantes. Boas pastagens!


Hálito de habitar vocativamente no fogo. Ou uma floresta que faz arder longe os arredondados arredores & as arreliantes reboleiras.




Apolo dorme com a polla dorida (e um pouco dórica).
Apolo é òbviamente um louro, olímpicamente oxigenado, que enlouquece divinamente.
Apolo faz-me pensar em Apoladoro e por uma associação estúpida qualquer na Hipneromaquia poliphilia(?).
Apolo é o poleiro de onde podemos vislumbrar Ovídeo sem ser em video, mas como um escape dito mitológico que já nos sexualiza em farmacológica fábula desde Ur.

O insulto é algo animal e que existe muito antes do homem e da arte – e eu penso na insensatez fururista, dadaísta e todas essas doces rebeldias como uma sequela sempre adolescente do insulto que já vagueava nas aragens pré-históricas. Mas o insulto só se tornou desonesto muito depois de Rabelais quando se reduziu a essa vontade de futurar e partir hipotéticamente os museus. Os futuristas que morreram na primeira guerra salvaram-se da suspeita de virem a ser fascistas.

Depois há quem diga que o poetastro se limita a tentar reproduzir, ditirambicamente ou com deslavados classicismos os espasmos concretos do parto deste mundo (ou de outro, tão hiperreal quanto este!). E acodem as proclamações ou ultimados fadistas das peixaras que antigamente vendiam o seu peixe na rua, com uma fé que falta aosd mercadores da cultar. Sim «vender o seu peixe», escamar dogmas, na rua, longe dos escrúpulos das cúpolas e das paspas de sarrabulho dos papados.

O insulto nunca é abolido no indulto, e o acaso abolirá um dia os dados que o imitam limitadamente.

«primo: gstruftumbtumbtumb: geração espartana!»?

Não vamos no cortejo modernista a enterrorar as vítimas do fratididactismo. Porque a sopa modernista sempre nos quiz ensinar como deviamos ser asseadamente modernos, e a mim também me gusta com ganas em castelo muita da antigualha, e as suas excentricidades, e os lúbricos poetas escalabitanos e as coloridas casas onde se pintalgavam deuses cornudos e os faustos floridos das várias indias.

É certo que tem (e sabe a) uma certas graça proclamar com desempoeirada voz (CRAK! PING! PONG! PUFF!) e dar gargalhadas satíricas de altas janelas com um certo desdém pelo que se tornou rápidamente obsoleto – a relevância é uma intermitência muitas vezes juvenil , embora também possa acudir na senilidade graças a afadigadas claques e rebuscadas quecas (surfa no arfar). Várias camadas historicizáveis acodem como uma remediamento nesse entressentido.


Agarramo-nos a convicções como a edulcorados gurús. Tornamos bendito o modo como somos encornados pelo destino e até achamos pouco. Convertemo-nos a uma embaciada clarividência e depois até cravamos os dentes na nossa própria carne. Mas acima de tudo tememos as garras muito ordinárias da burocracia que noutros tempos se esmerou com a caligrafia e que agora se desmazela em hálitos cibernéticos, rápidos, nauseantes. Lembramo-nos que havia e ainda há graça em determinados gestos e sorrisos e que é mais fácil encontrá-la nas mulheres.

O golfe é um desporto (se for um desporto...) soft porno bom para porky pigs.


A ti a entoação da graciosidade possivel, ò perigosa irmã!

E se digere Isis? Ou só a mastigamos como polifónica pastilha-elástica? Osiris, deus da atonalidade e do fatigante serialismo!

Temos tendência a resumir mal e porcamente as directrizes pedagógicas dos nossos papás e outros selectos educadores: é nosso dever trair afectivamente os antepassados, mas seguimos-lhes as rabugentas pisadas genéticas muito para além da fatal mímica.

E somos polimagnetisados, o que quer dizer que tudo nos atrasí, mesmo que isso pareça circunstancial e que um pudor disfarce os enervantes atractivos. Mas com o tempo, e (não podia deixar de ser) o consumos, perdwemos o respeito pelas dicas, divos, glórias passadas e palitativos presentes. O nosso apetite donjuanesco não se desencanta fácilmente, mas as antigas candidas belezas do mundo já sabem a sopa velha, e nem uma resumida meretriz pode dar a corda ao fulgor das imaturidades. Ou será que pode? Se calhar uma imbecil vontade de devir juvenil desemboca nas nossas almas como um meteorito pouco cavalheiresco, e nós cuspimos a nossa artrite velhaca e ficamos embasbacados e abismadamente surpreendidos com as belezas novas, venham estas da cultura ou da gesticulação ambigua dos que acvabaram de se safar da adolescência

Porque toda a teologia é romanesca e metereológica ao mesmo tempo. E cai nas nossas ficções ateias como música de intermezzo.

Antigona percorre o campo de batalha com uma navalha na mão porque quer barbear belos mortos. Os ex-habitantes dos cadáveres já fumam charutos havanos no Hádes. Um escafandrista surrealista cruza-se com este cenário épico em busca de mais um hábil non-sense. Está um fim-de-tarde digno de um quadro de Claude Lorrain e o ogre come umas batatinhas novas e lê Holderlin numa edição bilingue. Ele podia aproveitar para comer os cadáveres, mas prefere batatinhas salteadas.

A paixão faz-se febril porque perdulária. Nenhum troféu, nenhuma garantia, nenhuma acumulação amorosa – desperdicio sem banca ou mais-valias. E depois Antigona pensa como se tratasse de uma abstinência. Falham-lhe as guturais, sobram-lhe sons de lingua molhada. Há nela algo de balhelhas. Está só a arrumar o mundo antes de se despir da vida.

O campo de batalha é um cemitério de bagatelas. Alguém irá nele plantar favas e chegaram homens com cornamusas que as sopraram como quem assoa um nariz gigante. Zéfriro afina os sons da brisa do crepusculo. Há amantes que se beijam num caverna ao lado. Populaças plesbicitam. A plebe aplaude as plumas. O crepusculo demora e doura os bicos de papagaios. Ismene sente-se emproada.


Ai, intrincado tumulto céltico, inferninho de ornamentos, anti-deserto!

A infanta descasca uma banana couraçada e tem uma epifania com as escadarias de Odessa. Há nos bons realizadores de cinema a ânsia retorcida dos sátiros. São caprinos e gostam de fazer travellings como se fornicassem antecipadamente com os espectadores. (Ravel à revelia, rebeldes sem calças).

A infanta arranca-se cabelos numa imanação malévola de heroína shakespeareana encenada por um marroquino dissidente. Sente alguma intolerância no canto dos rouxinois. Senta-se perto da côr rosa. Sabe que as letras têm cores que perfumam as nossas ambivalências. E também sabe que os romances oitocentistas tentam ser meticulosos na descrição da epiderme do mundo, como um atento ciêntista que põe adjectivos ao que vê no microscópio. Tenho alguma intolerância perante o laranja-pálido. Mas dintingo-o com franqueza do salmão-acizentado. E também gosto da multiplicidade de cores que subtilizam nos quadros de Chardin, com muitos gatinhos à mistura.


A infanta apaixonadamente monta/mente/petrifica o marido e o amante medusando através das partes baixas. O marido e o amante tomam consciencia de que fazem parte de um trio errado e arbitrário que se compraz a ser musicado por tangos desmazeladamente piazzolanos.

Aquilo a que chamamos Kolossos pouco mais é do que um orquídolo – os testículos como aparição embriagante do divino – as orquídeas raras que levam no seu puro encontro ao extase há muito anunciado nas gazetas filosóficas e nas notas de rodapé dos entomologistas.

Depois despertamos a fêmea inerente à subincisão: Kali jagunça que vagueia aboriginalmente, face multipla, androgenia demasiado sexuada, sem frieza angélica, Janus cavalgando Eros e Thanatos, doçura cromática, suave odor.

Concupiscência wagneriano-motimovida com muito calo de ficar à espera, Zenão levado a música e libreto, aguardentando a agonia brejeira de os herois irem para uma decepcionante cama que desfaz os afagos fatais do absoluto.


Pérfida, prolifica Perséfona, deusa dos proletários (vénus dos suburbios peludos), protocefálica (e de canina trela), fecalcinética, fluídogenética. Os bafos de Perséfona sentem-se no sabor das raízes e na preciosidade das graínhas – frutos com pérolas cadentes. Por isso de pouco importam os tesouros que albergam os mundos subterrâneos. O autentico ouro sobra aos raios solares.

Polisinferno enciclocopérnico – as cidades saboreiam a sua auto-degradação como algo encadernável, mundo admirável na sua perfeição geométrica e na sua deterioração matérica, voluptuoso hibrído de avacalhada graça.



E todos sabemos que a poesia é a tradução desse fluxo que vem das gargantas infernais e que quer subir como insenso a uma narina demiurgica. Traduzimos com pouca sensatez o sufrágio das necrópoles. E há quem ponha os parametros acima dos estretores poéticos. Sabemos de antemão que o universo estrabucha em shlokas, em ritmos poligamos, e também em escapadelas de Ulisses pelas caladas das Calypsos (meteorismo bacano da escapadinha – que falha históricamente, tal qual como toda a história, que só nos dá, apesar da comoção estética dos exemplos, lições de decepção).

Avultamento de aviltamentos. Arvorada redundância como as àrvores que apenas crescem para alcançar um pouco mais de repetitiva altura, enquanto os bichos crescem na temível disputa territorial, porque o corpo não os deixa ir para lá deles mesmos.

(abastilhança). A bunda em dança. A vasta diarreia económica perpétua o crime mental, o natal desnaturado. Mas não o solestício cristianíssimo, xantuíssimo, arandico, hindustânico, islâmico, coptacabânico, criptocabalico - as traças ecunemicas devoram dos concilios os transes dos xamãs. Os ribanceiras químicas establecem-se com ganas mercuriais e triplamente grandes. Deus é o famoso erro anatómico: tirano e tiranicida – mesmo quando se humilha carnalmente no simpático papel de Filho. Ora, ora, e colabora...


As folhas caiem como os cadentes mortos cujos corpos caem. As cadências musicais abanam o fim... ou adiam-no enervantemente. Mas a perfeição da música é consentanea com as inclinações abanantes da morte.

Os paradoxos estrabuxando e estremam-se. São falsos como missa... e no entanto mais entranhados no mundo do que a verdade que os encena.


A ruína é a essência, o fragmento a escória. A babelização como dádiva que mascara o reconhecimento anterior às linguas – a mudez pré-oracular onde os deuses estrugem com incenso.


Velhas cuecas de velhas rameiras onde seria belo escrever com caligrafia gótica traduções brejeira de Luciano de Samosata. Letreiros detriorados em tabernas italianas do século XVII, pulgosas, tristes e adeptas de um Baco neo-realista.

Bandeiras abandonadas revivem a sua coerência no espólio invicto do revolucionário reformado. As citações grunhem porque se sentem bem referênciadas. A metáfora é o coração tenebroso do Transmutante (Mamutante). Um fluxo de associações circulam esfomeadamente e os cossacos uivam. O Zero potêncializa-se pavoneando-se.

(consequências burlescas por causa das ginásticas suecas da pipi-das-meias-altas – descodificação de serviços secretos que sobra às museologias bárbaras, atravessando depois, e ao pé-cochinho, as Coéforas, e continuando de altifalante em altifalante até aos pavilhões auriculares & chineses em que Cesário Verde é musicado por um Varése alfacinha)

Gulash. Ela prepara gulhash para o tolo do marido enquanto o amante se diverte numa certvejaria com outras tipas!

Leda é antiga porque as suas curvas encontram adeptos para cismos. Subtis teólogos cheiram as escatológicas entranhas do Apocalipse e fixam-se por copnsequência em parabolas fecais. A deterioração é certa!

John Cage puxou dos revolveres do silêncio e disse com alguma frequência que o camarada Mao era fixe – podemos condená-lo por ter sido um circunstancial simpatizante de um dos mais atrozes ditadores de sempre. E as saudações de Picasso a Estaline? O radicalismo dos que se acomodam em sofás de anátemas também gostam dos bigodes da musica do silêncio? Pitigrilli denunciou outros judeus como ele para salvar a pele? Savinio namoriscou por momentos o regime fascista? Heidegger não era Hitler... Mas era um patêgo que gostava de barrar o pão com rançosa manteiga pré-socrática. É certo que não curtia sofistas, e eras um tipo demasiadi sério para desfrutar as frivolidades agri-doces do romanesco. Não entremos nestas cavernas maniqueístas!!! A violência dos double-binds com que costura a política tornam os artistas e pensadores ainda mais inábeis. Dou-lhes o benefício da inocência.

Cinzas deixadas pelas instigações de Ares. Vento a urrar para lá dos desastres guerreiros. Mas as lendas amassam-se com signos. E gostam de chamar à baila, com excitação e tremor, as pastilhas épicas.

O fatigado violador entrou pela Amazona adentro como se a guerra fosse um pau em riste rápidamente murchável depois de ridiculamente esfregado em elástico antro. Mas os machos insistem em medir a sua relevância por palmos e violências.

Estrume onde o filósofo se equívoca na cura – as curas fazem-se entre o lixo e o asseio, entre o ensonso e o venenoso, entre a acção repousante e o repouso activante.

Horror dos horrores, mas com piri-piri. Hera, deusa que se enrosca como planta ornamental nos deveres conjugais e nas conjunções dos verbos. Ops. Ops. Ductílissima ciência de encastrado can-can, que nos traveste a alma esticando a perna antes do pernil. Gorgonaletheia: verdade que medusa e nos «amusa», que mata pelo olhar as ânsias icáricas. Taurina gorgonapigmaleia. Guliverada que se finda verde e vera numa distinta e cupiscênte displicência. Fino atino. A palavra decassílaba-se pindérica. Ops. Heia.]

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

XV – KAVOD (da representação)









Até o nirvana é pansexual

A sexualidade insignificante é hieroglífica.

O ruído é um Logos que não diz,
só esbraceja... e no entanto...

Aquilo que não pode ser dito
não pode aspirar a ser eterno.

A significação restítuível nunca é completa:
complementamo-la sempre que significamos outra coisa,
ampliamo-la quando afloramos o que é irrestituível.

Calas-te porque a glória do visível te emudece.











Os rios do silêncio
não movem os moinhos de Deus.

Estás grávido da Doxa
como de algo mais belo
do que a eternidade.

São as coisas subtis que mudarão irreversivelmente o Novo.


Só depois do futuro radioso ter morrido
é que se abriram as portas do encantamento.


Wheres the next party?












Agora o final com banda filarmónica tocando cada um para o seu lado. Ou a convenção (devidamente achincalhada) do final. FAY CE QUE VOULDRAS.

Abertura para o que der & vier! Tu pensas que tens suficientemente abertura? Estás enganado. As portas estão (pois claro!) apenas abertas. O dia de amanhã não se adivinha nem radioso nem glorioso. Limpas os dentes com fio dental, esboças um sorriso no espelho. A invocada liberdade não é nenhum futuro. Sais à rua e sentes-te embriagado. Porquê? Porque sentes a glória, como uma névoa, no ar – KAVOD!

O que é que se segue?

A hora «é severa», dizia Rimbaud. O que ganhamos nunca está garantido. As trompetas com que anunciámos algo talvez melhor não serviram para deitar abaixo as infecundas Jericos que por aí andam. A revolução permanente do corpo e do sujeito são um mito, mas um mito que usamos como estimulante de uma pequeníssima revolução não menos dura, e no essencial mais prodigiosa, como todas as coisas delicadas e amorosas.









As partidas que a vida prega convidam ao sono e ao aquietamento, a desistir, realisticamente, dos prazeres que vêm enredados nalgum sofrimento. Não vamos pela via da frustração. É mais o entusiasmo do que a esperança que varre a inércia para mais longe. A luta a encetar não é por moinhos de vento, por algo inacessível, mas pelo melhoramento quotidiano das nossas competências, e pela difícil partilha da nossa alegria com os outros, com alguma justiça e riso.

As nossas oficinas, onde a improvisação, a refutação e a «revisão» assentam os seus arraiais, buscam uma academia. Essa academia acolhe-nos numa entrerrecusa ou num transpretexto. A academia garante que não estamos sós, mas que também não obrigamos ninguém a partilhar uma confidencialidade e uma mudança «radical» de vida.










Um pouco de nada. Uma liberdade sem enguiços. Um simpósio quase romântico ou místico (mas nada de poltergeists!). Ou meteórico, apaixonado e teso.

Vamos acedendo, ao longo do tempo, ao inevitável esquecimento. E no esquecimento há uma perpetuação oculta. Mas entretanto deixamos alguma memória à solta enquanto cosemos os botões de um casaco velho...









A perpetuidade, fruto da relação memória/esquecimento é como um lapsus linguae: cristaliza-se num zero grávido. Pavão zero?

Quem conhecerá os frutos fartos desse zero?


(INTERLÚDIO) (da representação)

















A delinquente insistência (gabada inconsistência), comummente exaltada, de que o progressivo é um lento movimento de ruptura com os seus micro-regressos e suas orgânicas sistémicas, não nos obriga ao isolamento em tímidas unidades, mas antes nos excita para as maravilhosas mecânicas de ligação-corte com os exteriores: novas unidades sistémicas nas quais, como parte, se é actor – mimesis interior acasaladinha à mimesis exterior.

Valerá a pena acreditar (?)numa complexidade-limite jamais atingida e num processo revolucionário em curso (good old PREC!), no corpinho e na omnívora mente (caso acredite haver diferenças entre eles! O que não é o nosso caso!).




Somos agora forçados às linguagens
desejantes,
e nas linguagens amaremos
as liberdades mais do que possíveis –
explora-las-emos interligando-as
desfazendo-as, dispersando-as e reunindo-as
para as entraçar novamente em viperino penteado
de gongórica Gorgónia.

A consciência cínica do Disperso é ela mesma
factor bélico de Unidade – conjunção maneirista
de carburantes contrários – através do riso,
das manas catástrofes
& em ópera disfarçada de opereta –
o tragicamente risível.



A mudança existe para assentar arraiais
noutros prados, para repousar na velocidade:
gesto ginecológico, diluição
nos anéis do híbrido –
e se o esquecimento deforma
também a memória transforma
regenerando, iluminando e limando
diligentemente, o mambo dos mundos.

XIV – CRITICISMO & AUTONOMIA (da representação)











Júri – desacreditá-los mesmo quando nos dão prémios ou nos absolvem.

O homem realizar-se-á exercitando-se nas suas múltiplas fronteiras físicas e psíquicas: classificando, reduzindo, desclassificando, complexificando, etc. – reinventando-se a cada momento.

Eu sou o meu corpo, isto é, um pouco de espaço e um pouco de tempo, para o qual convergem e divergem tantos espaços e tantos tempos.



A revolução permanente exige
muita disponibilidade para cada momento.

Só mudamos o mundo
quando nos deixamos mudar por ele.

Mudar de símbolos é mudar a pele às metáforas.

O criticismo refina-se no cristianismo.

A comunhão, no cristianismo, inverte o processo de sacríficio: ao sacrificar o deus aos crentes diviniza os crentes. No dominio da dádiva passa-se de um processo de «desmaterialização» para uma comunhão crítica e somática que interioriza: a autonomia.





É procurando que nos desencontramos.

A autocrítica piedosa autonomiza-nos.

Deslumbrante é a ironia dos eclipses.

Diluí-mo-nos num trabalho
que vos torna mais contemplativos.

Aprendemos a contar com a matéria sem ter que andar a comprar favores aos deuses.

Os deuses já não consdolam: só acompanham.

















Uma fruição moral não é necessariamente uma fruição judicial, e pode até ser uma fruição profilática – as exigências estéticas passam (quizas!... quizas!... quizas!...) por aí. Querer mais e melhor em vez do apenas bom. A excelência não basta, e é desprezível se estiver alicerçada numa excessiva repressão. Daí a vontade de sublime, do better than the best, do báquico, do pulsional.

Marinetti proclamava (estrepitosamente!) a guerra como a única higiene do mundo – apelo futurista e heraclitiano à catástrofe. É certo que há uma dimensão erística que é salutar e fortificante, sobretudo onde reina a moleza (natural ou social) e o conformismo. Mas a guerra está longe de ser a única higiene – podemos até dizer que é uma das piores doenças. Foi a guerra que, ironicamente, acabou com o futurismo ao matar um número significativo de futuristas.

Apocalipses simétricos – toda a decadência é contemporânea da eternidade. A guerra também se embrenha em sentimentalismos piegas. Frieza e compaixão...



A obra não se explica como um corpo ideal, mas como corpo utópico. Tornar a obra post-apocaliptica e metacatastrófica é dar ao corpo a visibilidade das suas invisibilidades.

Se existem elementos corpusculares constitutivos na obra eles apenas interessam como desejo e alegoria descritiva, como fachada, muro, de uma cosmogonia outra que se inscreve nas células vazias do elemento actuante – o corpo.

O corpo opõe-se ao Corpo. O corpo narcísico, gestual, performativo, difere (através do seu fandango) do corpo universal, do corpo que é conquistado aos demónios que cochicham no inconsciente.

A liberdade é o espectáculo do não-espetacular.

A organização dos espaços busca a ambiciosa colaboração da incerteza para forjar complexidades alargadas e a precisar de ajustes na roupa – destabilização libidinal das instabilidades que se equilibram mutuamente.

Dizemos não à economia que simula a imediaticidade espectacular (espremendo-lhe o sumo!). O minimalismo é o ascetismo de consumo, a evidência pseudo-moral, o puritanismo capitalista (com havano e cachucho!), a manigância maneta.



A «boa-forma» é uma impostura moral que tenta desviar a porca evidência do corpo, e a politica como transmutação de corpos (com os copos!). Queremos uma politica transcomunicacional, sexualizada, espacial, palpável, fazendo desabrochar o envolvimento, a porneia omnipresente da natureza.

A arte é uma necessidade luxuosa e intensa: um reequilíbrio feito de regulares (e reguláveis) desequilíbrios – isso é homeostética.

A história das convenções passadas torna a nossa achincalhada actualidade mais futurista – é o passado que faz a profilaxia e que garante a generosidade do futuro através deste presente.

Escrevemos – «contar ou não contar com as utopias, mera questão de táctica» – a táctica aqui era combater o cepticismo fadista (tão punheteiro quanto o dos cínicos) através de um alegre dogmatismo metamórfico.

Substituição constante de convenções, mamã! Experimentar para desocultar os erros espinhosos! E mais do que nunca o perpétuo encontro, cara a cara, com o desconhecido que se dissimula no conhecido, porque há sempre um desconhecido à espera de nós onde não o esperamos (são as boas expectativas turísticas!).

Nada é suficientemente conhecido ou farejado. Contra o manhoso medo, as tias censuras e o prestígio gigolô do silêncio!



Não há limites para os universos. Os universos são sempre insuficientes, um work in progress. Avançar, numa voluptuosa guerrilha, pelo vago, pelo indefinido (mas também no conciso e no defeninte), desdramatizando os pavores, nascendo para renovadas necessidades. É assim mesmo!

XIII – EXPERIÊNCIA (da representação)










Uma ciência humana
necessita quer do veneno que a destrói
quer do cobiçado antídoto.

Um paradoxo nunca se resolve,
nem através do golpe de teatro da complementaridade.
Mas esquecemo-nos rápidamente dos paradoxos que nos atormentam quando escorregamos por causa de uma banal casca de banana...

Na esfera revolucionária, o impulso mimético
afecta antes de mais a meditação.

O elemento conceptual, é como o fiambre:
um entremeado sensaborão,
embora inalienável na linguagem, na arte,
e também na puta da vida.

A introdução de conceitos é frequentemente um protesto
contra a conceptualidade da arte.



A arte é imitação de algo inimitável,
é semelhante ao reconhecimento sem objecto.
Na mimesis, porém, liberta a sua adrenalina
que não é nada conceptual.

Experimentando matamos a morte.

Deixamos de experimentar ao tentar asfixiar
as imagens imortais.

A simulação distância,
a dissimulação realiza.

Os deuses introduzem-se nos nossos corpos
para se experimentarem uns aos outros.

A experiência é uma abolição da história para a história.

A incarnação é encantação criativa.

O corpo droga-se melhor com símbolos do que com alegorias
– mas também tem outras ressacas.

O excesso simbólico é uma dessimbolização que tranquiliza.

Para experimentares tens que te desnudar
para além da pele e dos ossos.














Queremos esbracejar. Os gestos saíem-nos como algo aparentemente inconceptual, mas os signos estão aí, como fantasmas de um sentido grávido mesmo antes de engravidar. O gesto é ingénuo? Em boa parte. Mas também é um hálito cultural, o rasto de balbuciamentos civilizacionais. O gesto serve como aposta – é a passagem do corpo para um espaço um pouco mais alheio. Aposta não-pascaliana. Aposta aberta, sem convicções nem Deus ao fundo. O ganho pode ser nulo. Aposta como saída adolescente, a ver o que acontece.

Esquecemo-nos que os gestos são já bombas teóricas, e que o bios theoretikos não se opõe a estas vigorosas marcas. Temos que pensar com eles, e não ao seu lado. Pensar os gestos é gesticular pensamentos, é aceder à ebriedade do ornamental, a uma forma de criticismo pragmática. Estamos com as coisas, em acção, alegoricamente, comprometidamente.

Esta treta negra, este abutre que se vangloria da presa inexistente, este esguicho que arranca a página à página. Cada gesto tenta demolir o instante que o gerou, porque a vida se tornou desleixada, isto é, insuportável.



Só a vontade de doçura me leva a intervir!

Na escrita, as coxas da minha amante surgem sobrehumanas, como se fossem as de uma deusa infernal. É claro que isto soa a falso, mas só eu sei pagar o empréstimo dos instantes com figurações imaturas. E a minha amante é uma tentação! Acções rápidas, gestos magricelas e desleixados. Há em tudo isto uma fragilidade que não pode deixar de ser divina!

Pintar para humilhar o autor. Pintar para deixar ver os podres e as fragilidades. Pintar para tentar pôr a nu o que não se sabe. Pintar porque ainda não encontramos o nosso cantinho no mundo. Pintar para exprimir a nossa disponibilidade e acessibilidade.

Pintar para liquidar o autor? Pintar para desentranhar o co-autor? Pintar para emancipar o autor de todos os fantasmas e da sua obra?

Fartámo-nos de massacrar com bombásticos manifestos quer o «eu» quer os nossos gastos inimigos. Quisemos construir arranha-céus sem alicerces. Se calhar vamos continuar a tentar. Mas primeiro tiremos as tampas às Utopias. A revolução é mais um refugo de intenções. Contamos para isso com as adrenalinas acumuladas ao longo dos «míticos» passados.




A aceitação experimental do mundo, não uma luta infernal ou angélica contra ele.

Toda a história de arte está imersa em gestos, em ideias-gestos, em programas-gestos, em conceitos-gestos. Não é o gesto a expressão actual dos inevitáveis equívocos «miméticos»?

Substituição continua de gestos, substituição mimética, sabotagem infracriptográfica.

A conceptualização é a convenção catita, o obvio no qual a gente acredita, o dizível com quem gostamos de jogar aos dados.

O inconceptualizável é o que fica? É tralha? Vai para a arrecadação? Será mais tarde encontrado, como curiosidade, em antiquários?



A realização artística toca as arestas das regras, regras que se querem não-defenitivas, mas desprobabilizadoras. Regras do não-determinante. Para um improvável possível. Como não era dantes.

XII – INSURREIÇÃO (da representação)








«as lovers will contrast their emotions in times of crises
so am I dealing with my environment»

Não gostamos que os outros pastem demais na nossa vida.
Mas a vida dos outros também é a nossa vida.

Não há diferença entre insurreição e ressurreição.

É a silenciosa insurreição
que nos devolve a temível inocência.

A insurreição é a acção que nos sabatiza e subtiliza.

Seduzimos o caos porque este é bastante polimorfico.

A anamnése torna o banal mais erótico.

A anamnése reconhece-nos como absolvidores de passados.

As imagens exageradas
destroem velhas contradições.

Somos férteis porque não procuramos ser fatais.

A verdadeira vida começa na insurreição depois da morte.

Qualquer emergência é o triunfo provisório
de uma obscura minoria num cantinho
epidémico de um sistema.













Existem dois aspectos que roçam constantemente o Corpo e o Envolvimento: o gesto e o ornamento. Ambos ora se afastam, ora se aproximam a passos largos.

Se o gesto teve um papel privilegiado dentro do teatro e da épica do «modernismo», já o ornamento constitui uma espécie de tabu, por não tocar nas áreas dedilháveis da «santa» funcionalidade.

O ornamento foi esquecido e afastado para longe da civilização do trabalho e da acção, continuamente condenado por incontornáveis teóricos e assimilado frequentemente ao retorcido kitsch. O aspecto decorativo era encarado pela sua imediaticidade visual, pela sua concorrência para um objectivo, pela sua harmonia formal, pela sua agradabilidade aos olhos (ah, bon, c’est joli!).



Esqueceu-se a plaisanterie, a brincadeira luxuosa, e, fundamentalmente, a grande presença orbitral do envolvimento (o environment).

O ornamento, no entanto, não pode viver uma aventura isolada do corpo, como mera continuidade em relação aos projectos minimais. Não basta escrever figura. Não basta ornamentar – é necessário, através desse acto lúdico, avançar para uma área em que um projecto de vivência esteja incluído.

O ornamento é «altamente» revolucionário. O ornamento para uma sociedade futura (fuck the fake!). O ornamento para o desconhecido (allways).

A arte das sociedades ditas primitivas é frequentemente sábia na conjugação do corpo e do envolvimento. O ornamento é o sinal da indissolubilidade entre corpo e envolvimento – é do domínio da «relação», da «abertura», da exploração-investigação lúdica do espaço. Neste tipo de investigações o ornamento é contraposto à lógica (fiável?) da proporção (que implica unidades fechadas, íntimos, duplos, uma coerência ancorada na mortalidade) que a tradição renascentista nos ofereceu (obrigadinha!) , mas que as actuais circunstâncias fizeram deslocar da arte para as tecnologias, como uma emigrante chique chegada à Califórnia.

Há que fundar graciosos envolvimentos – regressar à matriz, utópica e, romanticamente, viver a aventura de uma nova civilização (com ou sem frustração?).



A confusão (a realidade existente) entre efeitos, produção de efeitos e ornamento levou à ruptura com o generoso público, deixando imensas lacunas por preencher. Este é arrastado por medias que o fascinam, mas que não compreende. Inventou-se o ART WORLD como destinatário patologicamente especializado, snobmente participativo, e com tomates minúsculos. A sociedade de corte gostava de chupar o tutano às iguarias artísticas. É dessa estética do petisco exquis que somos hoje filhos. Temos fome e só nos dão umas taralhoquices desenxabidas.

Ora o gesto, pai do arabesco, é a reacção irracional a situações de crise: o gesto aproxima pelo agir, correspondendo a uma necessidade afirmativa do sujeito, implantando a sua presença através de marcas ou rastos. O gesto é uma emergência narcísica que visa a espinhosa liberdade, mesmo que se trate de uma aparente sublimação – expulsão de energias reprimidas com a passagem a um envolvimento maior, na qual a presença do sujeito se vai dilatando: presença sexual e presença social numa pastagem sensual. A aparência politica e a religiosa, filhas da moral e do controle, só chegam ao cortejo mais tarde.



Com a dilatação dos gestos já não há um imperativo egoísta porque a necessidade de marcação dissolve-se e abre-se na consciência de que tudo devém exterior, chegando a uma humanidade sem «rosto», nem maquilhagem. Esta torna-se numa acção para o envolvimento, numa máquina de emaranhar e desemaranhar o mundo, no mutatus mutandis das mutações.

A permanência do gesto nestas situações é moderada e menos violenta, pois já não serve a esconjuração imediata de embirrentos espíritos, nem uma transcendência primária, mas é útil para o devir de uma sociedade menos injusta (ó comunistas, aclamai-me! Acalmai-me!) graças à prática de uma desconstrução permanente.

As consequências do alargamento do gesto levam a enfrentar as «grandes escalas». O gesto torna-se um hino planetário/panfletário: paisagens flutuantes, mas sem gralhas sublimes.

O gesto pode ser um motor do progresso da mimésis, mas nunca será o único motor desse progresso (o único que verdadeiramente interessa ao homem): torna reconhecíveis os basic scribbles, desfigura os códigos para os transformar, mas não completa a operação.


É um acto, ainda assim, irresponsável, infantil – os putos que andam por aí ainda não se aperceberam de como a vida pode ser tão fixe! Este ser-se infantil é como a espontaneidade das doutrinas taoistas, uma experiência mais do que um conhecimento, uma intuição desprovida de moral, uma chinoiserie a puxar para o ecológico.



Mas, e insisto, é na vontade do gesto (por mais que este crie um ambiente ingénuo, festivo, irresponsável ou até egoísta) que deve radicar o motor de uma sociedade com tomates, entre o marasmo maroto das refutações e o magnifico devir das convenções.